segunda-feira, 31 de outubro de 2011

-ANTES QUE TERMINE O DIA-

Outro dia, tive uma grande e grata surpresa. Deram-me um filme dizendo: “Veja, vai gostar”. Olhei que filme era e o nome não me dizia nada, nunca tinha ouvido falar. Fiz cara de dúvida e a minha interlocutora garantiu que era bom e que lembrou de mim quando assistiu. Não dava pra recusar, né? Pois bem, ontem me bateu uma insônia brava e com isso liguei o DVD e assisti o indicado filme. Vou confessar: Estou balançado até agora.

Sentei-me então diante desta tela em branco do meu blog e fiquei pensando em como recomendar o filme, tarefa que se revelou um tanto mais complicada do que parecia. Falar sobre filmes que são considerados obras de arte, que têm elementos inusitados, atores pouco óbvios, mentores surpreendentes é relativamente fácil, acredite. O difícil é falar sobre algo que precisa fugir do obvio.

É engraçado falar sobre "Antes que Termine o Dia" porque geralmente não assisto a filmes feitos para chorar, não tenho paciência. Gosto de comédias. Ainda mais um que eu saiba previamente que é feito pra chorar, como foi o caso. No entanto, este, sem que entenda muito bem o porquê, me prendeu. Nem que quisesse eu poderia desligá-lo depois que comecei.

Outro motivo que torna inusitado falar sobre este filme é o fato de a Jennifer Love-Hewitt ser protagonista dele. Ah, já sei, você deve estar se perguntando: “Como assim? Resenha de filme da Jennifer Love-Hewitt? Alô-ou! Tá louco?”. É certo, eu também pensaria assim. Mas antes de fechar a tela, acredite: vale a pena.

Em contraposição a tudo o que pudesse servir de motivo para não ver e ainda mais não falar sobre este filme, há um rol de razões para fazê-lo. Por exemplo, não se trata de um artigo comercial, apesar de hollywoodiano e conta com uma trilha sonora lindíssima. Além disso, discute um assunto absolutamente delicado de forma bastante sutil, esbanjando sensibilidade, levando à reflexão e até mesmo à introspecção. E mais um detalhe, um pouco bobo, mas que me agrada muito: é ambientado na Inglaterra, então o inglês que se ouve é deliciosamente britânico.

O filme começa enfocando um casalzinho jovem e bonito acordando junto num belo apartamento e cuidando da vida. Ele um executivo bem sucedido, ela uma musicista muito talentosa. Nada errado a um olhar superficial. Mas, se prestarmos um apouco mais de atenção, detectamos logo os erros. Muitos, muitos por sinal.

Então é inevitável nos perguntarmos: quantas mudanças não faríamos em nossas vidas se tivéssemos a visão clara de tudo o que está errado? Muitas, eu garanto. Quantas vezes nos portamos de maneira absurda e até mesmo objeta, sem sequer nos darmos conta? E quantas coisas importantes perdemos por negligência, por não enxergarmos o óbvio?

E por que é que não temos essa visão? Será alguma deficiência, limitação inerente ao ser humano? Duvido muito. Todos nós temos plena capacidade de perceber todos os elementos presentes em nosso dia a dia, apenas vivemos imersos demais em nossos próprios umbigos e em nossos problemas para refletirmos o quanto agimos equivocadamente a torto e a direito.

O que você faria se olhasse à morte de frente? Entraria em pânico? Provavelmente. E mesmo que ela estivesse ali para alertá-lo sobre a sua conduta, ficaria tão paralisado que sequer poderia fazer algo a respeito. Certo? E se ao invés da sua própria morte, vislumbrasse a morte daquele ou daquela que mais ama? Se visse diante de si a perspectiva de não poder ver de novo aquele(a) que está sempre ali à sua volta, e que muitas vezes é negligenciado sem que você sequer se dê conta disso? Se entendesse que amanhã aquela pessoa não estaria ali para ouvir nada do que tivesse a dizer, ainda que merecesse um pedido de desculpas ou uma declaração de amor? Alguns ainda assim ficariam paralisados. Outros tentariam aproveitar o pouco tempo que resta. Quem sabe até pudessem mudar algo do que fosse acontecer? Quem sabe pudessem fazer valer a pena um dia juntos, mais até que uma vida inteira?
É este o enfoque da história, por isso o título original “If Only”. E se? Só se...

O filme lida de maneira admirável com sentimentos controvertidos como arrependimento, culpa, impotência, saudade, amor e cuidado. Quanto é suficiente? Como é que sabemos quando se está deixando a desejar num relacionamento, numa amizade? Se ao menos nos déssemos ao trabalho de olhar em volta e perceber a infelicidade do outro, poderíamos facilmente identificar quando agimos errado. E mais, poderíamos evitar o sofrimento daquele a quem amamos e até mesmo corrigir os nossos passos.

Mas e então, tudo andou errado. Ainda há o que consertar? Há. Requer mais coragem, contorcer-se de culpa ou se esforçar para mudar? Lamentar o erro ou aprender com ele? Existe uma segunda chance? Sempre há tempo para mudar o rumo da estrada?

Todas estas questões estão em "Antes que Termine o Dia". Um filme basicamente sobre sensibilidade. Sobre a bênção que é ser tocado por coisas sutis. Feliz daquele que se emociona sem restrições, que consegue ver beleza nos lugares mais insuspeitos, que agradece as pequenas coisas. Não estou falando de se debulhar em lágrimas enquanto ouve baladas, mas de saber fechar os olhos e apreciar o calor do sol, o barulho da chuva, o riso de alguém que se ama. Feliz daquele que olha o mundo e enxerga cores, luz, dádivas, oportunidades. Porque sentir é um dom e aquele que não sente vive em vão e, portanto, já está morto.

Doug
Nada Como Viver
31 de Outubro de 2011