sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

- “GANHEI O PRÊMIO NOBEL... E QUE?” -

Em um momento como esse que estou passando, com minha mãe hospitalizada, confesso que posso dizer que sou a fragilidade em pessoa.
Mas são pessoas como a Duda, que mesmo a quilômetros e quilômetros de distância conseguem se tornar uma fortaleza pra mim.

Recebi agora por e-mail e posto aqui na íntegra pra compartilhar com vocês:


From: dudalvez2000_vip@hotmail.com
To: douglas@probase.com.br
Subject: Noite de Três Lobos
Date: Fri, 10 Dez 2010 15:56:04 +0000


“Há 12 anos atrás eu era uma pessoa diferente.
E hoje eu seria, certamente, uma pessoa completamente diferente se não tivesse havido, daquela forma, aquele 10 de dezembro…
Muita coisa mudou desde aquele dia, mas até essas mudanças se deram em conformidade com o que começou a nascer ali. Parece que desde aquele momento eu sabia que hoje estaria a escrever isto, ou que haveríamos de passar por tudo o que já passamos juntos.
Não sei te explicar porquê, porque desde aquele dia e até hoje eu própria não consigo explicar, embora já o consiga entender, aqui dentro.
Também penso que talvez não o conseguisses entender na totalidade. Não deve ser fácil que alguém consiga ver o tamanho de um sonho. Do sonho de outra pessoa. E hoje, de um sonho realizado.
A realização de sonhos tem muitas vezes, em nós, um impacto que dificulta a tomada de consciência desse fato. Nunca aconteceu de passares por uma experiência emocionalmente tão forte que depois te falhe a memória sobre ela ou que tão simplesmente te pareça que aquilo não aconteceu contigo?
Deixa-me contar uma coisa:
Qualquer escritor tem como grande objetivo ganhar o Nobel, é o expoente máximo daquilo a que se propõem quando escrevem. Mesmo que conscientemente não o tenham como objetivo. O José Saramago conseguiu descrever com muita subtileza o que isso representou no momento em que soube que o tinha ganhado e, posteriormente, quando passou a ser detentor do premio. Ele dizia que no momento em que lhe deram a notícia ele saiu sozinho por um aeroporto algures na Europa e disse para ele mesmo: – “ganhei o premio Nobel, e quê?”… Aparentemente pode parecer que nada muda quando realizamos um sonho, mas depois passamos a ser um pouco um “produto” daquilo que desejávamos e atingimos. Ele contava que ás vezes, sozinho em casa, olhava para o premio e não conseguia racionalizar na mesma intensidade do que deveria sentir.
Há algo de semelhante que me acontece contigo, embora saiba que são situações que não se devem comparar.
Deixa-me mostrar como ele se exprimiu em relação à sua conquista: “(…) Era uma grande notícia, é a mesma coisa que quando a pessoa que jogou na lotaria sabe que ganhou vinte milhões de euros. Claro que fica contente, mas a dimensão da razão porque está assim não a pode ter dentro de si com a qualidade de uma coisa com que se vive ou que logo desde o princípio está no seu lugar. Sei que estava evidentemente feliz, mas era uma felicidade que não se manifestava feliz porque era uma grande coisa da qual eu não tinha noção do tamanho. Teriam de passar dias, semanas, meses ou até anos para que isso se tornasse pacífico dentro daquilo que somos. E repare que ainda hoje, de vez em quando, me surpreendo a pensar que tenho o Premio Nobel. E são breves, claro, brevíssimos momentos de surpresa, mas existem!”…
Sei o quanto a tua memória é falha, mas lembro de ter visto no carro, de manhã, envolta da nossa loucura na noite da loja, e ao seguirmos para casa eu ter lhe dito: “Isto é um bocado surreal”, e você me perguntou: “Porquê?”… e eu respondi: “Por quê você não é daqui, não pertence a esta parte da paisagem e da minha vida, você não pertence aqui”… e você fez alguma piada tipo “Sériooo? que novidade que não sou daqui”… mas é que aquilo que eu queria expressar ali não passou de meras palavras ditas por impulso, palavras que vinham da surpresa feliz de te encontrar todos os dias na minha vida. Quando finalmente conseguimos dormir, lembro de ter acordado numa das vezes em que você levantou para ir ao banheiro e ao te ver-te sair de lá pra regressares pra cama eu ter sorrindo pra você e pensado “Ganhei o prêmio Nobel, e quê????”. Refiro-me aos mesmos dias, meses e talvez anos de assimilação de que o Saramago falava. Ainda me pego em momentos de surpresa. Pela ordem natural do que seria suposto acontecer com a minha vida, não era para eu abrir os olhos e te encontrar no meu quarto, na minha casa, na minha vida. E isso tem uma valência tão forte que é uma das melhores coisas da minha vida!!!
Além de tudo isto ainda existe à distância, essa barreira de elástico que estica até não poder mais no limiar da saudade e que se solta num segundo a cada reencontro. Tive de aprender a viver com ela. Guardei você no bolso do peito e todos os dias te levo comigo aos melhores lugares: é contigo que partilho os melhores acordes das melhores músicas, é para você que sublinho os melhores trechos dos melhores livros, empresto a você os meus olhos, os meus ouvidos, a totalidade dos meus sentidos porque sei sempre em que verso querias parar para reler, que refrão iria decorar primeiro ou que paisagem iria querer fotografar e fazer um quadro. E assim vamos estando juntos todos os dias, há 12 anos…
Olho para ti como se fosses meu filho, meu irmão, meu pai, meu marido, meu melhor amigo, meu premio Nobel…numa pessoa só e sem que em algum momento um desses papeis prevaleça. Eles estão sempre juntos numa equação para a qual nunca encontraremos o “X”.
Esse “X” é aquilo que somos quando estamos juntos, quando rimos até nos faltar o ar, quando você levanta as sobrancelhas porque vai dar bronca, quando disputamos amigavelmente uma poltrona de janela no avião, quando nos abraçamos, quando bebemos do mesmo vinho, quando vamos à loja, quando nos fazemos chorar…
Felizes daqueles que conseguem sentir alguma paixão quando olham para os seus melhores amigos, uma paixão que vive para além do significado onde normalmente é conotada. Uma paixão pueril, genuína que te faz feliz pelo simples fato da outra pessoa ESTAR e SER e que te motiva a conquistá-la mesmo depois de já o teres feito algumas vezes. Felizes daqueles que conseguem ultrapassar um estado de amizade morna. Felizes dos que conseguem viver com os outros, aquilo que sentem por eles, independentemente daquilo que se passa ao redor!
Apesar de tudo que já vivemos que já fizemos, e de tudo que tenhamos por viver e por fazer juntos, há uma parte de mim que ainda passa por ti e se surpreende com a tua presença. É nessa ínfima parte de nós dois que ainda vamos descobrindo coisas novas um sobre o outro, ao mesmo tempo em que na parte incólume que fomos sedimentando, repousam atentas a cumplicidade e a incondicionalidade.
Não sei o que eu possa dizer mais… a verdade é que há precisamente 12 anos atrás a esta hora estávamos a ver-nos pela primeira vez e esse acontecimento mudou-me…
Talvez você nunca consiga entender… talvez eu nunca consiga explicar, não importa…
Continuarei a dormir embrulhada nessa gaveta onde guarda as pessoas que mais consegue te amar…
Desde 98 que todas as noites de 10 de Dezembro são noites de Três Lobos em mim.
Resolvi escrever! Afinal, foi naquele dia que nasceu uma parte de mim que talvez nunca tivesse existido sem ti!
“Ganhei o prêmio Nobel…. e quê???”
Love… “



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Minha Resposta
Duda,

Não vou te ligar agora porque as lágrimas estão vindo aos meus olhos sempre que penso no que você escreveu e no que você significa pra mim. Quando estou contigo sou como o melhor de um barco perdido no mar, meio à deriva mas dono de si, meio sem saber onde ir e ao mesmo tempo sabendo da possibilidade incrível de ir a qualquer lugar. A beleza desse “estar contigo” me eleva, me alegra e me ajuda a ser cada vez mais eu. Te Amo e cada vez mais me sinto junto a ti. Um cheiro!

Doug
Nada Como Viver!!!
10 de Dezembro de 2010