segunda-feira, 4 de outubro de 2010

- YES, WE CRÉU NA VELOCIDADE CINCO! -

Minha mãe sempre foi uma dona de casa exemplar. Sempre recebeu muitos elogios por seu tempero impecável, por manter a casa sempre em ordem, enfim... Sempre realizou com louvor a profissão que escolheu: cuidar da casa e dos filhos. Quando a gente recebia visita então, o zelo se multiplicava e tudo brilhava ainda mais por aqui. Não se via nada fora do lugar, estava tudo limpo, cheiroso e a comida boa era mais variada que muito self-service por ai. E foi assim a minha criação. Aprendi que pra receber visita, a casa devia estar em ordem, pra eles sentirem prazer em estar aqui, se sentirem acolhidos e com vontade de voltar sempre.

Me recordo que na mesma semana em que roubaram a prova do ENEM, a cidade do Rio de Janeiro foi escolhida a sede dos Jogos Olímpicos de 2016. Lembro que rolou uma puta festa na praia de Copacabana em plena sexta-feira ao meio dia, pra comemorar. Confesso que bateu até uma inveja daquelas cem mil pessoas na praia, àquela hora, enquanto eu quase me matava de tanto trabalhar. Mas enfim, era Rio, eram cariocas... Eles podem.

Confesso também que não fiquei tão feliz com a notícia como eu deveria ficar, como brasileiro. Falta de patriotismo? Acho que não. Excesso de patriotismo, eu diria. Vamos receber visitas importantes em pouco tempo – (Sim! Cinco anos até a Copa de 2014 e sete anos até as Olimpíadas é pouquíssimo tempo diante do trabalho que temos pela frente) - e a casa está uma zona!

Quantas CPIs vamos ter que aturar até lá? Quantas provas roubadas? Quantos Sarney? Quantos mensalões? Quantos milhões de dólares escondidos na cueca? Quanta corrupção? Quantos políticos entrando e saindo, sem resolver nada? Quantos assaltos? Quantos seqüestros? Quantos reféns? Quanta gente morrendo em corredores de hospitais à espera de atendimento? Desigualdade social até quando?

Qual a impressão os hóspedes terão a nosso respeito? Que imagem eles levarão quando voltarem pra casa?

Me preocupo com isso sim, da mesma maneira que minha mãe sempre se preocupou com as visitas aqui em casa. Me preocupo, porque amo o meu país, amo sua beleza natural. Mas não curto esse patriotismo cego que comemora por qualquer coisa, quando temos muito mais motivos pra cobrar do que pra soltar fogos de artifício.

E agora? Vão fazer o que? Recolher os mendigos na rua e trancá-los em abrigos durante os jogos? Vão tapar os buracos das rodovias com asfalto podre, que vão durar enquanto durarem as competições? O novo ou a nova presidente que irá tomar posse ano que vem vai criar a "Bolsa Suvinil" e doar tinta aos moradores da Rocinha pintarem a fachada de seus barracos e a favela parecer mais colorida e alegre? Maquiagem?

E a fome no norte e nordeste do país, como fica? E o caos no SUS? E a educação? Vão fazer o que contra as greves de professores, contra o vandalismo nas escolas? Vão fazer o que contra o analfabetismo? E a segurança? E a violência? E o transporte público? Vão maquiar também?

E agora? Vão investir no esporte? Ou vão achar bonito a gente terminar os jogos em casa com uma classificação medíocre no quadro de medalhas? Vão financiar e apoiar nossos atletas? Ou simplesmente virar as costas e deixar que eles se fodam, treinando por conta ou mendigando patrocínio de empresas privadas?

O Brasil não precisa de maquiagem. Já somos bonitos por natureza. A gente precisa, sim, de atitudes eficazes e permanentes. A gente precisa que resolvam nossos problemas pra nós mesmos, e não pro período dos jogos. A gente precisa "créu" neles, e não que eles "créu" na gente.

A gente precisa que arrumem a casa, e não que varram a poeira pra debaixo do tapete.


Doug
Nada Como Viver!!!
04 de outubro de 2010


PS: Estava aqui escutando uma música do Cazuza "Brasil" e eu acho que veio a calhar com esse texto.